Esse artigo pretende brevemente refletir sobre a conciliação de duas facetas tão distintas mas imprescindíveis a homens e mulheres de negócios (ou pelo menos àqueles que se pretendem inovadores e prósperos): as facetas do executivo e do intelectual.
Marilena Chauí, quando perguntada no programa de entrevistas Roda Viva em 1989 sobre se era possível conciliar a executiva com a intelectual, respondeu brevemente: “Não, não é possível”. O caso de Marilena é emblemático. Intelectual conhecida, filósofa, escritora e professora da USP, Marilena tem extensa e importante obra literária publicada, (além de inúmeras contribuições em simpósios, conferências e palestras em ambiente acadêmico, especulando sobre filosofia e militância política), o que naturalmente exigiu-lhe dedicação para a ampla pesquisa e o mero ato de se sentar para escrever. Ocorre que em 1988, a então prefeita eleita de São Paulo Luíza Erundina a convidou para assumir a Secretaria de Cultura. Marilena aceitou, e tornou-se portanto, pelo menos naquele momento, uma executiva. É dever do executivo, sabemos, nomear e gerenciar equipes, idealizar e planejar o futuro, delegar missões (ou simplesmente tarefas), gerenciar os acontecimentos (ou os não acontecimentos) ao longo do tempo por parte de sua equipe, corrigir as rotas que eventualmente estejam equivocadas, cobrar, incentivar, reconhecer e motivar sua equipe, fazer acontecer o que se planejou. Em suma, uma rotina e um modelo mental radicalmente diferentes da rotina do intelectual. O intelectual, por sua vez, dedica-se ao “ócio”, isto é, à reflexão. Lembremos que “negócio” vem de “negação do ócio”: quando fazemos “negócio”, negamos a nossa condição momentânea de intelectuais e somos executivos. Quando nos dedicamos ao “ócio” (momentos de serenidade para a reflexão, que em nada tem a ver com a ideia de descanso descomprometido), a figura do intelectual se sobrepõe à outra. Basicamente conclui-se que de fato não há como conciliá-las.
Pois: uma carreira bem sucedida exige de nós o muito. Que sejamos reflexivos para sermos criativos e inovadores – que tenhamos ideias e conceitos próprios no que se refere à nossa condição de formuladores do pensamento: que sejamos intelectuais. E exige-nos também a capacidade executiva, isto é, o poder de realização, a capacidade de planejar e a disciplina e a competência para fazer acontecer. Está dado o desafio: conciliar essas duas facetas.
A conclusão à qual cheguei, meramente pessoal, mas que aqui divido com aqueles que possam vir a se interessar: para manter em alto nível as duas vertentes, nada como a disciplina da agenda. Uma vez na semana, (normalmente às sextas-feiras, mas nem sempre), quando em São Paulo, a “agenda de trabalho”, de manhã à noite, é a dedicação plena ao estudo, à pesquisa, à leitura de largo fôlego. Para isso, é preciso “renunciar ao escritório”, isto é, delegar o que se pode delegar e assumir a ausência sem culpa. Desta maneira, as leituras avançam, a pilha de livros “a examinar” diminui e se renova, as novas ideias ocorrem e o vigor para a volta à lida executiva se apresenta especialmente.
Muito negócio e pouca leitura não faz bem para o negócio. A leitura dedicada (não necessariamente apenas em temas ligados diretamente ao negócio, mas especialmente àqueles que aparentemente em nada têm a ver), como parte da agenda, por sua vez, além da alegria de viver profunda que proporciona, faz e muito bem para os tais negócios.